a fragmentação do mundo em
opostos.
A verdade posta assim tão óbvia -
preto e branco, bom e mau, pobre e
rico - choca, corta, corrói.
Afinal sou o lado, do lado,
de lá ou de cá?
O mundo da periferia não é o meu?
Se não é, qual será?
Em que lado me encaixo?
Sei bem onde estou.
Confortaria crer que merecemos
a trilha dada
conforme a vontade divina.
Filosoficamente
seria cômodo dizer
que o maniqueísmo inexiste,
e como disse Riobaldo, está tudo misturado;
- nem preto nem branco, nem bom nem mau,
nem pobre nem rico.
Camufladas as divergências de interesses,
as ideologias que já não posso distinguir,
alheia às injustiças sociais,
faço de conta ser normal
o papel social que desempenho.
Socorro! alguém mais capaz,
mais perspicaz que eu:
pode me ajudar a desmisturar a confusão
em que fui anovelada?
Há caminhos comuns possíveis a trilhar?
Busco algo que não seja difícil
participar,
que não me comprometa
e não me tire do conforto do meu lar.
Algo que eu não precise dedicar tanto,
Quem sabe apenas ajudar a patrocinar!
Já não sou tão jovem
e as perguntas insistem não calar...
Consciência, por que vem me despertar?
Queria tanto rir, ler, dançar, cantar,
amar...
Mas a periferia insiste bater à minha porta,
por que será?
Bastasse empregados a me servir,
meninos nas janelas do carro a pedir,
subalternos nas curvas de minha
vida...
perspectiva do berço esplêndido em que
nasci!
Juro! bastariam para me lembrar
do puro acaso que é
me encontrar do lado de cá.
Melhor continuar filtrando o olhar
- com a ajuda das lentes polaroides de meu
último rayban -
fazendo ginástica, yoga, lendo, rezando...
tomando prozac para aliviar,
me entorpecendo
de dor, de culpa, dormência -impotência...
Me escondo muito bem,
Em conversas, leituras, escrituras,
na falsa esperança de que a verdade se
revele
nas entrelinhas das palavras não
ditas,
das palavras não escritas.
Ou, ao contrário,
que se desvende
no momento em que construo
meu discurso
ou no texto
que ora escrevo.
Como diz Riobaldo,
Viver é mesmo muito perigoso!
Texto de uns 10 anos atrás. Sobre a cisão social que vivemos.
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