terça-feira, 28 de maio de 2024

Michel Nisenbaum, me aguarde para uma xícara de café no Céu

Não conhecia Michel Nisenbaum antes de 7 de Outubro. Mas desde que tomei conhecimento de seu desaparecimento me engajei, como outras centenas de pessoas, na campanha para o seu retorno e na divulgação de seu nome para que não fosse esquecido entre a longa lista de sequestrados pelo Hamas naquele dia nefasto. 

Conhecendo pouco a pouco sobre Michel, passei a admirá-lo cada vez mais e desejava muito poder um dia conhecê-lo pessoalmente. Mas com a chegada do anúncio do resgate de seu corpo de Gaza, no dia 24 de maio, e de que teria sido assassinado em 7 de Outubro, chegou também o fim da esperança e o início de luto para seus familiares e amigos que o amavam muito. Quanto mais ia ouvindo ao longo dos meses comentários de como Michel era um filho, pai, avô, irmão, tio e amigo dedicado, mais o admirava. Tanto era dedicado que encontrou seu fim enquanto tentava chegar à base militar de Reim para buscar a neta de 4 anos, que estava com seu genro, um oficial do exército. Há depoimentos de que ele salvou a vida de jovens que fugiam do Festival Nova de música, quando se encontrava a caminho de Reim, antes de ter sido morto e seu corpo levado refém para Gaza. 

Durante esses longos meses que se passaram, acompanhei o trabalho incansável de seus familiares e amigos em manter o nome de Michel em destaque para que fosse resgatado. Neste período, foram organizados encontros para contar histórias sobre ele: "Mi panui le café? / Quem está livre para um café?", era a pergunta que ele fazia aos amigos e que intitulou a campanha. Cafeterias do sul do país organizaram uma campanha em seu nome, com cartazes, copos, chaveiros, com escritos como: "Michel, mechakim le kos cafe itecha / Michel, te esperamos para um café com você". Seus familiares deram entrevistas no rádio e correram mundo falando sobre ele e pedindo o auxílio de outros países para resgatá-lo. Os amigos organizaram uma caminhada em seu nome ao longo do rio Yarkon, já que Michel era guia de turismo, ligado especialmente a passeios na natureza. 

Nesse tempo, aprendi que a mãe de Michel, uma mulher bonita, forte e corajosa, se chama Sulmira e que tem 86 anos; que a irmã se chama Mary, que veio antes deles para Israel, incentivando a vinda da mãe e do irmão então aos 13 anos; que Mary tem entre seus filhos a Ayala, que conheci engajada no resgate do tio; que as filhas de Michel são Chen e Michal, que amam o pai imensuravelmente e lhe deram 6 netos; que nesse tempo nasceu uma nova netinha que ele não chegou a pegar nos braços - a sexta - e há mais um/a a caminho!, sinal de esperança no futuro e de continuidade da família que ele e a mãe de suas filhas plantaram em Israel; que Michel deixou muitos amigos, pois era ativo em serviços comunitários, servindo no Maguem David e na guarda de fronteira. 

Michel Nisenbaum foi conduzido ao descanso eterno em 26 de maio, por seus familiares, seus muitos amigos e uma multidão de anônimos, assim como eu e muitos outros brasileiros e israelenses, que foram lhe prestar as últimas homenagens e honrar sua vida e sua memória. Que fique a esperança, fruto das boas ações de Michel Nisenbaum neste mundo.  

Como uma pequena contribuição para a preservação de sua memória, deixo assim um registro da minha despedida ao nosso conterrâneo brasileiro-israelense, em nome de milhares de brasileiros anônimos, daqui e do Brasil, que como eu se engajaram, torceram e rezaram pela volta de Michel: Que o nome de Michel Nisenbaum seja benção e luz sobre Israel, hoje e sempre. 

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Raquel Teles Yehezkel 

Israel 27/5/2024












quarta-feira, 1 de maio de 2024

Ayrton Senna Derech haShamaym

Só quem vibrou, 

torceu, 

esperou, 

rezou,

xingou,

chorou,

comemorou,

se emocionou,

amou,

acompanhou,

treinos, largadas, pit-stops, saídas, acidentes, defeitos nos carros, ultrapassagens, linhas de chegadas, bandeiradas, pódiuns, banhos de lavar a alma dos brasileiros com champanhes...

Só quem viveu

a Fórmula 1,

conheceu campeões, 

oponentes combativos 

do naipe de Alain Prost, 

Nigel Mansell, 

Michael Schumacher,

e ouviu as narrações emocionadas de Galvão Bueno,

pode entender o que sentimos

há exatos 30 anos 

na Tamburello, 

em Ímola, 

quando Senna voou 

a caminho do Céu

num fim de semana em que absolutamente tudo deu errado...

E a Fórmula continuou a correr...

Apesar de tudo... 

apesar de nosso Ayrton,

nosso atleta mais amado...

O mundo de queixo caído...


Foi ali, na Tamburello, 

que eu e todo o Brasil 

nos enviuvamos naquele dia

desse gênio de coração generoso na vida, 

e implacável na pista...

Nesse dia, eu estava em casa, em Ramat Hasharon, com meu marido, dois filhos pequenos e um casal de amigos assistindo tudo aquilo ao vivo... 

Em Israel, domingo é um dia comum (primeiro de maio também), e eu tinha uma prova na faculdade... Claro, não tive condições de ir... Passei uns três dias em estado de choque, em frente à televisão, acompanhando e gravando tudo que eu via nos canais europeus, que comentavam estarrecidos o acidente. 

Em 1994 ainda não havia tv a cabo no Brasil, mas em Israel já tínhamos... Assim, eu ia gravando trechos sobre Ayrton direto das TVs italiana, espanhola, francesa, alemã, inglesa... 

Assisti ao vivo e gravei todo o cortejo e enterro em São Paulo, com a presença de todos os pilotos da Fórmula 1, com imagens de helicóptero da Globo, emitidas para o mundo todo. Eu assistia via CNN, narrado por comentaristas ingleses, especialistas em Fórmula 1... Afinal, Senna havia acabado de ser contratado pela Williams... 

O mundo embasbacado com o amor que os brasileiros dedicavam a ele... 

Nessa fita escrevi: 

Ayrton Senna : דרך השמיים/ a caminho do Céu... 

Amor do meu coração e de todo o Brasil...


Raquel Teles Yehezkel 

Israel 1.5.2024