sábado, 21 de outubro de 2023

A guerra em tempo real

Nesta noite, pela primeira vez, pedi ao meu marido um remédio para dormir; um daqueles que ele guarda para quando é pego em uma de suas crises crônicas de coluna. Um remédio pra dor, pra desmontar e dormir. Estava muito nervosa e ansiosa pelas notícias ao vivo da liberação pelo Hamas de duas reféns israelenses-americanas, e não conseguia mais me relaxar. 

Estava também com raiva, por mais uma vez o Hamas estar no comando de nossas vidas naquele momento, dando um show planejado e ao vivo, como se fossem os comandantes a ditar a estratégia da guerra que se desenvolve neste momento entre o estado de Israel e o Hamas. De novo, o sentimento de hosser onim. 

Estávamos chocados ao começar o jornal de erev Shabat (véspera de Shabat), exatamente às 20:00 de 20 de outubro, e os jornalistas receberem ao vivo a notícia de que estavam sendo liberadas pelo Hamas duas reféns, mãe e filha, sem pedirem nada em troca, para mostrar ao mundo que eles são humanistas e não os monstros ferozes que o mundo presenciou no massacre de 7 de outubro contra a população civil no sul de Israel, em suas próprias casas ou enquanto dançavam em um festival internacional de música eletrônica.

Como numa cena surreal de games online, em cadeia nacional, a TV israelense cedia palco às ações do Hamas, enquanto no canto da TV ia-se mostrando os nomes de todas as vilas e regiões em que no exato momento soava o alarme ao cair de bombas. O norte e o sul do país sendo bombardeados, enquanto o Hamas anunciava ao mundo, por meio do nosso jornalismo ao vivo, que estava liberando naquele momento, 20 de outubro, duas reféns, entregues à Cruz Vermelha para serem repatriadas a Israel. 

Enquanto isso, os nove analistas do canal 12 sentados à mesa e ao vivo, iam recebendo notícias e nos atualizando: mãe e filha americanas-israelenses de Chicago haviam chegado a Israel recentemente para os feriados de Sucot / Tabernáculos para festejar o aniversário da matriarca da família. E que dez membros desta mesma família haviam sido feitos reféns em Gaza, dos quais estavam liberando duas. Que já tinham a identidade delas... mas que estava censurado dizer nomes e mostrar fotos até que os familiares próximos fossem avisados antes da divulgação para a mídia. 

Então, enquanto se esperava de 20h as 21h que a família fosse avisada, começou ao vivo um acerto de contas nervoso de como chegamos a esta situação e sobre a pressão nacional e mundial que viria para se continuar o processo de liberação e troca de reféns, o que poderia impedir Israel de entrar em Gaza para destruir o Hamas... Bla, bla, bla... sem fim, pois noticiário não tem fim. Enquanto isso a ansiedade a mil...

É possível dormir assim, com a raiva de mais uma vez assistir ao vivo o show orquestrado pelo Hamas? Momentos difíceis... 

Mas são nos entremeios que nos renovamos, angariamos forças. Quando vemos e produzimos ações bonitas, de força e de solidariedade da sociedade civil se organizando por conta própria, paralelamente à ajuda do estado, recebendo em suas casas refugiados de cidades inteiras do norte e do sul do país. Fazendo comidas, comprando equipamentos necessários, levando lençóis e toalhas para os milhares de israelenses deslocados de suas casas, vilas e cidades neste momento. Não há isralense que não esteja engajado em atos de solidariedade. E isso é visto, é sentido, é enxergado na movimentação pelo país, nas redes sociais, nas arrecadações realizadas. 

Neste momento, as divisões internas se acalmam e passamos à unidade como povo. Os religiosos ortodoxos que não são obrigados a servir o exército e servem apenas cerca de 1200 pessoas por ano - e este é um dos rachas na sociedade -, só nesta semana se voluntariaram 3 mil, sendo que desses, 120 já começam a servir nas linhas da Tzahal ainda nesta semana, dentro de suas próprias profissões, como médicos, enfermeiros, motoristas, tradutores, etc. O comportamento solidário da sociedade civil e sua colaboração diante das orientações do Comando de Retaguarda retorna em pequenos e grandes milagres que colaboram para o sucesso do todo.

Como os meus sentimentos, fervilhando, e os de solidariedade se aflorando, estão os sentimentos de todo am (povo) Israel. Pois quando falamos Am Israel chai (o povo de Israel vive), falamos de Israel como um todo, dos milhares de judeus que estão agora em sintonia com estes mesmos sentimentos e ações na América do Norte, na Europa, na Ásia, na Austrália, na América Latina. Israel é um só, um só coração fervilhando, esteja fora ou dentro deste pequeno país que você conheceu um dia, ou sonha conhecer pelas peculiaridades que são só suas...

Israel 21.10.2023

(Na imagem as reféns Judith e Nathalia Raanan, liberadas pelo Hamas na noite de 20 de outubro)