terça-feira, 28 de abril de 2020

Em memória de Dani Barzellai

Dani era israelense e brasileiro, nascido no Rio de Janeiro em 5 de fevereiro de 1964, o caçula de uma família de 11 irmãos, todos nascidos no Rio, inclusive sua mãe, dona Raquel. Ainda menino, mudou-se com a família para Israel e foram morar em Bror Chail, um kibutz ao sul de Israel fundado por pioneiros egípcios, tendo recebido em seguida muitos brasileiros. O pai faleceu antes do Bar Mitzva de Dani. A grande família, sempre cercada por amigos e familiares, gostava de festas e costumava comemorar as festividades judaicas. Não demorou muito para que as festas da familia aliadas à alegria da cultura brasileira transformassem pequenos eventos de finais de semanas em festas regadas a samba e batucada, onde amigos chegavam com novos amigos.

Foi assim que o irmão Salva, Salvador, chegou com o amigo e radialista Eli Israeli, que trouxe, dentre outros, Arik Einstein, a maior figura da música israelense, e Mati Caspi, que difundiu a música brasileira em Israel, para o terreiro da família Barzellai no Kibutz Bror Chail. Aí se iniciava toda a tradição da música brasileira nesse Kibutz, e Dani era parte integrante da batucada, tendo, inclusive, trabalhado nos palcos de Mati Caspi.

Dani gostava das tradições judaicas e estudou em yeshivá (escola religiosa) por um período; sabia de cor todas as rezas e canções tradicionais e era shomer mitsvot (guardava os mandamentos). 

Sobressaiu-se no Exército como soldado da unidade de combate Golany, uma das mais prestigiadas no país, onde se formou Oficial das Forças de Defesa de Israel. Conforme depoimento de seus comandantes e colegas, era sempre o primeiro voluntário para as missões que deviam cumprir. Participou como combatente golany na Guerra do Líbano e na Intifada. Depois, serviu miluim (período de serviço militar anual) até o ano de 1989.

Entre agosto e setembro de 1989, quando convocado para o serviço militar anual, na região de Bikat Hayarden, foi feliz da vida, achando que iam ser dias de férias com os antigos colegas de armas, pois era uma região considerada tranquila, fronteira com a Jordânia, no nordeste do país. Mas aqueles eram períodos de Intifadas, e, nesses dias que Dani imaginou tranquilos, recebeu aí o chamado de Deus, tendo sido atingido após o grupo de guarda sofrer um ataque a tiros nessa fronteira... Depois de uma perseguição ao atirador, que veio da Jordânia, morreram ele e seu amigo Rony Hanuka, z"l. Conforme depoimento de outro membro do grupo, Dani partiu imediatamente, sem sofrimento, num Shabat, em 2 de setembro de 1989...

Dani, que amava crianças, deixou à sobrinha o seu nome, guardando a sua memória na família.

Daniel era filho de Raquel z"l e Emilio Barzellai z"l, e irmão do Salva, Jaime, Carlinhos, Rebeca, Ester, Sarinha, Miri Z"l, Elisa, Mori e de minha amiga Debi Barzellai, que na manhã de Yom HaZikaron de 2020 (Dia da Memória dos soldados tombados nas guerras e das vítimas do terrorismo), me enviou um vídeo emocionante, que contava toda esta história.

Dani Barzellai
יהי זכרו ברוך לעולם ועד

Texto de Raquel Teles Yehezkel
Para Debi Barzellai com carinho
Yom HaZikaron, 28.4.2020
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"Danny 02", de Peter Sela, produzido por Hila Barel, acessado no YouTube em 28.4.2020

https://www.izkor.gov.il/fallen/en_ac2f6a7caa2758ce02db930fe4ea305f

Fotos de jornais israelenses da época







domingo, 5 de abril de 2020

Em tempos de corona

Demorou, mas a ficha caiu. Custei a entender o que os especialistas vinham tentando nos explicar: a vida não vai voltar ao normal; tão cedo não voltaremos à rotina que tínhamos antes da pandemia, demorando bem mais do que podíamos imaginar. A covid 19 veio para ficar, e vai continuar atacando, às vezes fraca, outras, de forma letal, até que surja uma vacina eficiente ou quando, finalmente, a maioria da população estiver imunizada através do contágio. Fora isso, nos resta tentar manter o controle através de números e gráfico achatados, no país e no mundo inteiro. Até lá, vamos continuar o isolamento social, ainda que de forma mais relaxada: redução de pessoas em locais de trabalho, transportes públicos, eventos sociais. Enquanto, também, vamos continuar combatendo com restrições mais severas focos regionais, onde os números são mais altos, na tentativa de mantê-los dentro de limites que permitam uma rotina produtiva, até que descubram uma vacina eficiente.

Em Israel, estamos na quarta semana de isolamento; a curva já achatou, e, à princípio, a epidemia está sob controle. Assim, pretende-se começar a liberação do isolamento, gradativamente, após a semana de Pessach (a Páscoa judaica), que termina em 18 de abril. Mas estamos longe, o mundo todo, de voltar à normalidade.

Parece que teremos de começar a pensar em novas estratégias para a vida, novas formas de manter nossas necessidades, atividades e negócios. E mudar implica em saída da zona de conforto: movimento, adaptações, inovações, agilidade, perdas e ganhos. Mudança total no tabuleiro da vida...

Marcus meu irmão me disse que essa é um previsão pessimista. Do Brasil, me gravou um áudio falando tudo o que eu havia dito acima, mas de maneira mais pragmática, como é seu modo de ser. Preocupado, disse para eu não ficar pessimista, que ele garante que a partir de julho, agosto, ainda que gradativamente, vamos voltar à normalidade.

Achei graça no "te garanto", mas quando Marcus afirma alguma coisa, eu confio nele, com segurança. Ele tem a lógica matemática dos gênios e a capacidade de ouvir dos justos. Uma receita para poucos, pois é capaz de enxergar, de ouvir e de mudar. Marcus é o caçula de casa e o presidente daquela que deve ser a maior cadeia de livrarias do Brasil. E isso diz muito dele. Quando muitos estão a caminho da recessão, ele lidera com calma, passo a passo, com segurança, sem atropelar, com simplicidade, paciência e ouvidos. De sua gerência democraticamente partilhada com seu board, entre funcionários e seus familiares, mais de duas mil pessoas dependem diretamente dessa gerência.

E ele vem acompanhando de perto nossa experiência em Israel. Pediu-me para lhe passar as medidas de contenção adotadas aqui, pois estamos à frente de muitos países, acompanha nossos números e quer saber quais serão as regras para a volta gradual à vida econômica do país

Marcus, meu irmão, me disse para eu não ficar triste, que minha previsão é pessimista. Que ele me garante que do fim de julho em diante o mundo estará voltando, aos poucos, à normalidade. Ainda que um pouco diferente... E eu confio no Marcus.

Israel, Pessach 2020

Tel Aviv, foto ilustrativa